22/10/2025

Extinção de execuções fiscais impacta arrecadação de capitais, diz associação

Fonte: Jota Tributário
A extinção das execuções fiscais com valor inferior a R$ 10 mil teve impacto
relevante na arrecadação da dívida ativa relacionada ao Imposto sobre a
Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU). Levantamento conduzido pela
Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais (Abrasf) aponta para
quedas significativas no recolhimento de diversas capitais brasileiras nos primeiros
semestres de 2024 e 2025, após a edição de uma resolução do Conselho Nacional
de Justiça (CNJ) que determinou a extinção de execuções fiscais de valores
inferiores à cifra que estejam parados há mais de um ano.
Ao JOTA , o CNJ refutou os dados e alegou ter identificado aumento na
arrecadação de dívida ativa de IPTU a partir da resolução.
A publicação da resolução, em fevereiro de 2024, foi uma das primeiras ações
aprovadas no Plenário do CNJ na gestão do ministro Luís Roberto Barroso, agora
aposentado. O objetivo era diminuir o congestionamento no Judiciário. Ao fazer
o balanço de seu mandato em setembro, Barroso destacou que a medida atingiu
13 milhões de execuções, além de ter gerado a queda de 37% das novas execuções
fiscais e o aumento de 124% na arrecadação dos municípios.
A resolução exige a tentativa de conciliação ou solução administrativa e prévio
protesto do título antes do ajuizamento e também reforça a necessidade de
comunicação periódica dos cartórios às prefeituras sobre as mudanças de
titularidade dos imóveis, além de extinguir processos sem o CPF/CNPJ do
devedor.
A análise da Abrasf, contudo, é de que a norma tem estimulado a inadimplência
em torno do IPTU, que representa uma parcela significativa de arrecadação nas
cidades, com valores muitas vezes inferiores ao teto estipulado pelo CNJ. “A
grande massa de devedores de IPTU não teme mais a perda do imóvel e isso mina
a coercitividade da cobrança”, afirmou o assessor jurídico da Abrasf, Ricardo
Almeida, tributarista e procurador no Rio de Janeiro.
Almeida afirmou que os sistemas de pagamento criados — protesto, transações
tributárias, meios eletrônicos e digitais de comunicação e emissão de guias de
recolhimento ou novos meios de pagamento — não foram “suficientes para
contrabalançar esse impacto que a resolução está tendo na economia
comportamental”.
O problema do congestionamento, segundo ele, seria resolvido a partir da
efetividade na execução. “Bastaria cumprir os comandos legais de arresto e leilão
dos imóveis para tornar a cobrança mais eficiente. Extinguir processos não reduziu
custos do Judiciário ou das prefeituras; apenas melhorou índices estatísticos de
congestionamento”, ponderou.
Impacto em municípios
Há municípios, contudo, onde ainda não é possível ver uma relação entre as perdas
arrecadatórias e a resolução. Considerado a correção pelo IPCA-E, a capital mais
afetada teria sido Salvador, cuja queda chegou a 69,64%, saindo de R$ 26,8 milhões
no primeiro semestre de 2024 para R$ 8,1 milhões no mesmo período de 2025.
Os dados não podem ser analisados de forma isolada, já que, segundo a secretária
de Fazenda da cidade, Giovanna Victer, o alto percentual se deve a um Programa
de Recuperação Fiscal (Refis) feito em 2024, que aumentou a arrecadação do
imposto. Ao JOTA , Victer disse ainda não ter percebido uma queda, mas apontou
a resolução como um “risco”. “A sinalização é ruim, principalmente para quem
tem um ‘ticket baixo’ de IPTU, como Salvador”.
Em São Paulo, por exemplo, o cenário não foi alterado. Isso porque a Lei
Municipal 14.800/2008 já estabelecia como piso execuções de R$ 15 mil, regra que
continua válida na cidade, de acordo com o secretário de Fazenda do Município
de São Paulo Luís Arellano.
Em setembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) reforçou a validade da resolução
e sua aplicação prática ao reafirmar, com argumentos com base na jurisprudência
da Corte, de que a norma não interfere na competência tributária dos entes. Ainda,
que há caráter constitucional e de repercussão geral no debate. O ARE 1553607
foi ajuizado pelo município de Osório (RS) para questionar uma extinção de
execução de IPTU.
O que diz o CNJ
Ao JOTA , o CNJ afirmou que um estudo da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP)
identificou crescimento na arrecadação de dívida ativa de IPTU de 2023 para 2024
na ordem de 5,3%, quando a resolução já estava em vigor e que a norma
possibilitou o aumento da arrecadação, e não o inverso. Em nota, o órgão aponta
ainda que levantamento do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil
(IEPTB) apontou que os municípios protestaram 6,7 milhões de títulos e
recuperaram R$ 2,6 bilhões, ou 30% do total protestado, entre março de 2024 e
junho de 2025.
O estudo analisou dados atualizados pela Selic e pelo IPCA-E para padronizar
valores, constatando quedas significativas em praticamente todas as capitais.
Apenas Florianópolis e Manaus registraram alta, mas por fatores específicos como
o recolhimento baixo no ano passado e o recolhimento excepcional de uma
empresa, o que teria distorcido o número, respectivamente. Devido às isenções
dadas pelas enchentes em 2024, os dados de Porto Alegre não foram considerados.
Leia abaixo a íntegra da nota do CNJ:
- Não é correto afirmar que a Resolução 547/2024, aprovada por este Conselho
Nacional de Justiça (CNJ), impede a execução fiscal de dívidas abaixo de R$ 10
mil. Continua sendo possível a cobrança judicial de valores inferiores a esse
montante, respeitado o piso de ajuizamento definido por cada Município. Antes
do ingresso em juízo, porém, é necessária tentativa de solução consensual, bem
como prévio protesto da certidão de dívida ativa, medida esta que tem eficácia de
recuperação em média dez vezes superior ao ajuizamento. Tais medidas foram
instituídas como obrigatórias pelo STF (tema 1184). A extinção de execuções de
valor inferior a R$ 10 mil não impede novas cobranças nem se aplica a todos os
casos, mas apenas aos processos já ajuizados e que estejam há mais de um ano sem
movimentação útil, isto é, sem localização do devedor e de bens penhoráveis.
- A Frente Nacional dos Prefeitos identificou crescimento na arrecadação de dívida
ativa de IPTU de 2023 para 2024 na ordem de 5,3%. A Resolução nº 547/2024
esteve em vigor durante quase todo o ano de 2024, o que comprova que a norma
possibilitou o aumento da arrecadação, e não o inverso. Nesse sentido, a norma
auxiliou os Municípios a tornar mais efetiva a cobrança por meio da atualização de
seus cadastros, ao instituir a obrigação de os cartórios informarem às Prefeituras
todas as transações imobiliárias ocorridas nos últimos 60 dias, sem a cobrança de
emolumentos (art. 4º).
- Quanto à suposta “queda na arrecadação do IPTU em dívida ativa entre 2024 e
2025", especificamente em 19 cidades (capitais), é preciso confirmar os dados e
esclarecer se isso teria ocorrido em números absolutos ou relativos. Isso porque,
em tese, uma menor arrecadação da dívida ativa pode decorrer de um maior
pagamento espontâneo antes da inscrição, ou mesmo de medidas consensuais de
parcelamento e transação também anteriores à inscrição.
- Levantamento do Instituto de Estudos de Protesto de Títulos do Brasil (IEPTB)
apontou que, de março de 2024 a junho de 2025, os Municípios protestaram 6,7
milhões de títulos e recuperaram R$ 2,6 bilhões, ou 30% do total protestado.
Comparando os períodos de 3/2023 a 2/2024 e de 3/2024 a 6/2025, houve um
aumento de protestos de 162% (de 9,26 para 24,3 milhões). A média mensal de
arrecadação por esse meio subiu de R$ 27,7 milhões/mês em 2023 para R$ 87,2
milhões/mês em 2024 e R$ 274,5 milhões/mês em 2025.